instante

Henri Cartier-Bresson

o futuro não cabe nas linhas da mão, embora se possa ler esta caligrafia. o passado vive nos registros, nas memórias e nas saudades, às vezes eternas. o que importa, sabe-se desde sempre, é o presente. aquele instante para o qual raramente se olha com ternura, pois se está imerso nele. o instante é o único tempo concreto, é o único que pode ser vivido. o instante, objeto visível da existência.

existir, por sua vez, é o único presente real que se pode dar aos outros. os objetos, ainda que simbolizem os afetos e por isso sejam bem-vindos, não se comparam às existências de um, de outro, de muitos.

quando olho para o passado, percebo o quanto ficou em mim de cada ser autêntico que cruzou minha vida, de forma mais longa ou mais breve. sei que não posso apartar de mim o que tomei deles, o que me foi dado, o que aprendi a ver e a saber. sei, sobretudo, o quanto valem a coragem, a lealdade e a compaixão, e o quanto as fraquezas, tão humanas, podem apenas significar o lapso de um instante.

hoje eu estou de aniversário. cada cicatriz é a marca de um instante. uns mais belos, outros mais doídos. todos vividos com a certeza de que a existência concreta que os outros me oferecem é o bem mais precioso da vida a ser vivida.