Jean-Pierre Verdet é astrônomo do Observatório de Paris. estuda a astronomia antiga e escreveu “O céu: mistério, magia e mito”, que saiu pela Gallimard e foi editado em português pela Objetiva. seu texto, magnífico, fala do homem que se fascina pela noite negra, pela lua e pelas estrelas:
“O universo não passa de um grande vazio povoado de estrelas aqui e ali, em geral agrupadas em miríades. Povoado também de nuvens de gás e de poeira. Há mais de cinco bilhões de anos, uma dessas grandes nuvens cósmicas começava a implodir e dava origem ao Sol e a seu cortejo de planetas.
Inicialmente magma incandescente, o globo terrestre se resfria e se solidifica. Durante um bilhão de anos, a matéria reina sozinha sobre um mundo mineral e aquático. Então, em forma de molécula que mal se distingue da matéria inerte, aparece a vida num mar provavelmente sem margens, e vai se insinuando, adaptando, desenvolvendo, tornando-se mais complexa para enfim desabrochar nos continentes surgidos das águas.
No final do terciário, período geológico que precede o nosso, a paisagem terrestre é semelhante à que conhecemos, mesma geografia, mesma flora, mesma fauna, mas há um grande ausente: o homem. O homem que, no entanto, segundo os paleontólogos, já transparece numa raça de quadrúmanos por descobrir. E, há um milhão e meio de anos, graças a sombrias histórias de colunas vertebrais cujas curvas se compensam, o homem adquire a verticalidade. Há um milhão e meio de anos, o homem está em pé. Há um milhão e meio de anos, ele eleva os olhos para o céu.
Durante milhares de séculos, um silêncio quase absoluto, o homem se cala. De sua atividade técnica, que supõe a inteligência, deixa apenas alguns vestígios: seixos reunidos, artefatos lascados, raspadeiras, enxós. Porém, de sua atividade mental não há qualquer vestígio material. Depois, bruscamente, na última parte da idade da pedra lascada, há cerca de 50 mil anos, o pensamento humano se manifesta: um osso decorado com um pouco de ocre vermelho, contas de calcário onde se insinuam sílices e fragmentos de osso, as primeiras pedras gravadas, os primeiros esboços de esculturas, as primeiras sepulturas são provas emocionantes desse pensamento. Nas primeiras pedras gravadas, reconhecemos grupos de estrelas, constelações. Evidentemente, a astronomia é uma ciência muito antiga.
Muito cedo, a atenção do homem foi atraída pelos grandes fenômenos astronômicos e, logo, pelo mais evidente: a alternância dos dias e das noites. Bem antes de saber escrever, o homem conheceu as fases da Lua, com as quais fez seus primeiros calendários; percebeu o movimento diurno das estrelas, circular e uniforme, e que, toda noite, reconduz as constelações às formas permanentes; constatou a volta periódica das estações. Desde a pré-história, o estudo do céu deve ter provocado um movimento duplo do pensamento: a busca de leis naturais, imutáveis, que, em nenhum lugar como no céu, aparecem de forma tão evidente, e a tentação de colocar no céu, aparentemente inacessível à primeira vista, seres sobrenaturais e todo-poderosos.
Também muito cedo, foram constatadas as relações entre certos fenômenos celestes e terrestres; particularmente, em latitudes médias, entre o desenrolar das estações e o percurso do Sol pelo zodíaco, ou entre as fases lunares e a intensidade das marés. Uma introdução ao princípio da causalidade cuja aplicação irracional teve como conseqüência uma quantidade de crenças ingênuas e a astrologia.
Ao lado dos grandes fenômenos astronômicos periódicos, ocorrem acontecimentos excepcionais, muitas vezes espetaculares, como eclipses do Sol ou da Lua, cometas ou estrelas cadentes.
Também muito cedo, sem dúvida, o passeio dos planetas pelo grande quadriculado fixo das estrelas intrigava. Ademais, o céu às vezes se zanga, mesmo que seja esse aqui perto de nós: ventania violenta, raios, trovões, furacão, chuvas diluviais, trombas d’água ou tornados manifestam a cólera celeste.
Assim, no próprio seio da ordem que múltiplas leis constantes, simples e aparentemente eternas tornam exemplar, inscreve-se a desordem.”
ordem e desordem, permanência e movimento. eixo do imaginário que aparece, em mim, quando vejo o céu de minha sacada. com chuva, com vento, com estrelas salpicando, com silêncio absoluto.
7 comentários:
Speechless, as the soundless cosmos.
*
dá pra fazer uma fogueirinha na sacada?
*
O céu tá zangado aqui. Mas a chuva tava tão lindinha.
Eu também quero ver o TAO da tua sacada, em noites frescas de verao.
Leo, silêncio é bom.
Xon, sempre tem, vc não notou?
Reges, a chuva é sempre tão lindinha. :)
Thelma, vem!
Pena que não pára de chover, né Marcia, nem dá p/ apreciar as estrelas.... Só um vazio cinzento... Abs
E esta tua sacada tem endereço?
Postar um comentário